sexta-feira, 8 de agosto de 2008

A natureza da experiência mística ou transcendental - Stanislav Grof


As emoções ou sensações associadas às áreas divinas internas são comumente o oposto daquelas que uma pessoa pode encontrar nas regiões escuras. Em vez de dor ou alienação, pode-se descobrir uma sensação abrangente de unidade e interconexão com toda a criação. Em vez de medo, a pessoa pode ser possuída por êxtase, paz e por uma profunda sensação de apoio pelo processo cósmico. Em vez de vivenciar a "loucura" e a confusão, encontra um sentimento de lucidez mental e de serenidade. E, em vez de uma preocupação permanente com a morte, pode entrar em contato com um estado em que se sinta eterna, compreendendo que alguém é, de repente, o corpo e tudo o mais que existe. Devido, em parte, à sua natureza inefável e ilimitada, os domínios divinos são mais difíceis de descrever do que as regiões escuras, embora poetas e místicos de todas as épocas tenham criado metáforas para torná-los próximos. Durante alguns estados espirituais, pode-se entender o meio ambiente comum como uma criação gloriosa da energia divina, cheia de mistério; tudo dentro disso parece fazer parte de uma bela trama interligada. O poeta William Blake capta esse conhecimento do "sagrado" iminente:
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Para ver um Mundo num Grão de Areia
E um Céu numa Flor Selvagem,
Segure o Infinito na palma da mão
E a Eternidade numa hora.

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Outras experiências envolvem a revelação de dimensões, das quais não se está consciente na vida diária: elas transcendem o tempo e o espaço e são habitadas por seres celestiais e mitológicos. Essas experiências são freqüentemente acompanhadas por sensações intensas de uma força espiritual que inunda o corpo. As pessoas percebem os domínios místicos sendo permeados por uma essência sagrada ou numinosa e por uma beleza inexplicável, e têm, em geral, visões de jóias preciosas feitas de ouro, brilhantes, com extraordinária radiação, luminescência e luz resplandecente. Em Leaves of Grass, o poeta místico Walt Whitman escreve:
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Como num desmaio, um instante,
Um outro sol inefável me deslumbra completamente,
E todos os astros que conheci, e astros mais brilhantes,
[desconhecidos;
Um instante da Terra do futuro, da Terra do Céu,
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Assim como os seres se enchem com a luz divina resplandecente, os domínios transcendentais são incansavelmente descritos como existindo além das sensações comuns. O poeta americano Henry David Thoreau escreve:
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Ouço além do alcance do som,
Vejo além do alcance da visão,
Novas terras, céus e mares ao redor,

E, no meu dia, o sol faz empalidecer sua luz.
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Alguém pode vivenciar o Divino como eterno, imutável e infinito, como é caracterizado pelo filósofo chinês Lao Tsé no Tao te King:
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Há algo inerente e natural,
Que existia antes do céu e da Terra.
Inerte e insondável.
Esse algo permanece sozinho e nunca muda;
Espalha-se por todo lugar e nunca fica exausto.
Pode ser visto como a Mãe do Universo.
Não sei o seu nome.
Se for obrigado a dar-lhe um nome,
Chamo-o de Tao, e o nomeio como supremo.

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Muitas pessoas que vivenciaram essas dimensões interiores, reconhecem-nas como partes da essência ilimitada e efusiva de cada ser humano, que é comumente obscurecida pelos problemas e preocupações da vida diária. Por causa da sua lucidez e vivacidade, os estados transcendentais em geral dão a sensação de que são mais reais do que a realidade "comum"; as pessoas sempre comparam a descoberta desses campos ao despertar de um sonho, ao remover véus obscuros ou à abertura das portas da percepção. Algumas vezes fazem novas descobertas e adquirem conhecimentos complexos sobre o processo de vida de fontes dentro de si e que geralmente não lhes são acessíveis.
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Assim como alguém pode penetrar no domínio desolador da morte do ego durante a noite escura da alma, também pode encontrar um tipo de morte positiva do ego nos domínios transcendentais. Ali, as fronteiras pessoais se dissolvem temporariamente e a pessoa pode se sentir incorporada ao mundo externo ou ao cosmos. Um dos tipos mais comuns de desagregação é aquele em que as pessoas se sentem como se estivessem se perdendo no divino imanente, que é encontrado no meio ambiente. É comum sentirem que suas identidades individuais podem se debilitar quando se fundem ao mundo conhecido dos humanos, das árvores, dos animais ou da natureza inorgânica. Durante uma outra forma dessa experiência, freqüentemente se sentem incorporadas aos domínios divinos que transcendem a realidade diária.
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Alfred Lord Tennyson escreve sobre esse estado:
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Mais de uma vez quando
Me sentei sozinho, refletindo sobre mim mesmo
A palavra que é o símbolo de mim mesmo,
O limite mortal do Eu foi liberado,
E transferido ao anonimato, como uma nuvem
Que se dissolve no céu.

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Esta experiência, em geral, toma a forma de uma perda benigna do ego, uma dissolução das suas estruturas, que é necessária para se alcançar uma ampla definição do eu. O santo e filósofo indiano Sri Ramana Maharishi comparou esse processo àquele da boneca de açúcar que vai em busca de um banho de mar e se dissolve no oceano da consciência. Uma forma mais impressionante de morte positiva do ego é um confronto repentino com a luz, comparado pelos místicos à mariposa que voa para a chama sagrada e é consumida instantaneamente.
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Os encontros com as regiões divinas durante o processo de emergência espiritual são extremamente terapêuticos. Atingindo-as, a pessoa sente, em geral, emoções positivas, tais como êxtase, alegria, gratidão, amor e satisfação, que podem aliviar ou dissipar rapidamente os estados negativos, tais como a depressão e a raiva. Sentir-se parte de uma rede cósmica abrangente em geral garante à pessoa que tem problemas com o amor-próprio o desenvolvimento de uma nova auto-imagem.
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As pessoas envolvidas no processo e que passam logo por essas experiências se sentem afortunadas; desenvolvem uma compreensão filosófica que as acompanhará através das futuras mudanças. Sentem mesmo que, embora as coisas possam se tornar duras, ao menos têm uma idéia de para onde estão indo. É como dar uma olhada no topo da montanha, e então, mesmo que precisem voltar à base para escalá-la, têm a perspectiva de que há uma recompensa à sua espera no final da jornada. Isso é bem preferível à situação em que a pessoa gasta meses cavando um túnel através de sensações e emoções difíceis, sem nenhuma idéia de qual seja o propósito.
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Essas experiências positivas não ocorrem necessariamente como um estágio lógico na progressão linear, como um prêmio ao final de uma busca difícil. Muitas pessoas acham que têm que se livrar de problemas pessoais ou de bloqueios emocionais antes que essas áreas possam se revelar; quando se tornam acessíveis, sentem-se como se suas aparências fossem devidas ao trabalho árduo anterior. Porém, outras pessoas entram em contato, espontaneamente, com posições transcendentais dentro delas mesmas, muito embora não tenham feito nenhum trabalho sobre decisões difíceis. Em muitas emergências espirituais, as pessoas são orientadas periodicamente para resumir suas apreciações sobre esses domínios, e descobrem que se tornam mais acessíveis com o passar do tempo.
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"Retirado de: A tempestuosa busca do Ser; de Stanislav e Christina Grof"

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