quinta-feira, 22 de junho de 2017

Crise da meia idade - James Hollis


Texto retirado do livro "A passagem do meio" de James Hollis

Quase toda sensação de crise na meia-idade é provocada pela dor dessa separação. A disparidade entre a concepção interior do eu e a personalidade adquirida torna-se tão grande que o sofrimento não mais pode ser reprimido ou compensado. Ocorre então o que os psicólogos chamam de descompensação. A pessoa continua a atuar a partir de antigas atitudes e estratégias, mas estas já não são eficazes. Os sintomas de aflição da meia-idade devem ser bem recebidos, pois representam não apenas um eu instintivamente firmado debaixo da personalidade adquirida, mas também uma poderosa imposição de renovação. 

O trânsito da passagem do meio ocorre no temível choque entre a personalidade adquirida [principalmente na infância] e as exigências do Si-mesmo. Uma pessoa que passa por essa experiência frequentemente entrará em pânico e dirá: "Não sei mais quem sou". Com efeito, a pessoa que o indivíduo foi está para ser substituída pela pessoa que será. A primeira deve morrer. Não é de causar surpresa que exista essa enorme ansiedade. O indivíduo é intimado, psicologicamente, a morrer para o velho eu para que o novo possa nascer. 

Essa morte e renascimento não é um fim em si mesmo; é uma transição. É preciso passar pela passagem do meio para nos aproximarmos mais do nosso potencial e conquistarmos a vitalidade e a sabedoria do envelhecimento maduro. Por conseguinte, a passagem do meio representa uma intimação interior para que deixemos a vida provisória e avancemos em direção à verdadeira idade adulta, do falso eu para a autenticidade. [...]

[...] a passagem do meio começa com uma espécie de pressão tectônica que vem de baixo para cima. Como as placas da terra que se deslocam, roçam umas nas outras e acumulam a pressão que é expelida sob a forma de terremotos, assim colidem os planos da personalidade. A noção adquirida do eu, com suas percepções e complexos agregados, sua defesa da criança interior, começa a ranger e ringir contra o Si-mesmo, que busca a própria realização.

Essas ondulações sísmicas podem ser dissolvidas através da consciência do ego defensiva, mas a pressão continua a crescer. Invariavelmente, muito antes de a pessoa tornar-se consciente de uma crise os indícios e os sintomas já estão presentes [...]. A partir do ponto de vista terapêutico, os sintomas devem ser bem recebidos, pois eles não apenas servem de flechas que apontam para a ferida, como também exibem uma psique saudável e auto-reguladora em funcionamento.

Jung observou que uma neurose "precisa em última análise ser compreendida como o sofrimento de uma alma que não descobriu seu significado". Essa declaração não sugere que possamos consumar uma via sem sofrimento, e sim que o sofrimento já está sobre nós e somos portanto obrigados a descobrir o seu significado.

Nenhum comentário: