Texto de D. Júnior Viana Costa. Email para contato: juniorvianac@oi.com.br
O texto abaixo surgiu da necessidade de sustentar determinadas posições pessoais quanto ao universo teórico e prático da Psicologia Analítica. Não pretende ser elaborado em formato acadêmico ou ser minha palavra final sobre o tema. As referências ao final servem apenas como orientação. Permaneço inteiramente aberto às discussões. Trata-se de um texto informal que visa somente esclarecer a política assumida, principalmente na minha página Carl Jung Sincero, que tem sido alvo de diversas críticas por parte de alguns junguianos. Admite algumas lacunas que poderiam ser melhores trabalhadas. As críticas são bem vindas desde que compreendam bem a posição de onde emito meu discurso. Considero útil a leitura do texto como forma de se saber o que move meu trabalho na referida página. Peço desculpas pelos eventuais erros de digitação ou de português que possam encontrar. Obrigado.
Revisão de texto: JD Lucas
A psicologia analítica de Carl G. Jung: uma teoria anacrônica ou atual?
D. Júnior Viana Costa
As mudanças pelas quais o mundo, sobretudo o ocidental, passou nos dois últimos séculos abalaram profundamente os pilares fundamentais da vida humana. Quase todos os campos da experiência humana sofreram grandes metamorfoses e levantaram novas questões quanto ao papel do homem na sua relação com o mundo, consigo próprio e com a sociedade. Religião, tradição moral, ciência, ética, espiritualidade, diplomacia, mundo do trabalho, sexualidade etc, todos os campos foram abalados e se viram forçados a rediscutir suas bases. O historiador egípcio Eric Hobsbawm (1917-2012), definiu o século XX como o Breve século, a Era dos Extremos, que teve início em 1914 com a Primeira Guerra (cem anos atrás) e fim no ano de 1991, com a queda do muro assinalando o fim da antiga União Soviética. A Guerra Fria pode ser tomada como uma metáfora que reflete certa dissociação psíquica no campo da política. De um lado, os ideais de comunidade, de outro a supervalorização do individualismo.
Carl Jung nasceu em 1875 e veio a falecer em 1961. Presenciou as principais mudanças pelas quais o mundo passava, e, de certa forma, antecipou algumas das possíveis conseqüências de tais mudanças, sobretudo no que diz respeito ao uso unilateral da razão e seu prejuízo para psique coletiva, o que ainda compõe o paradigma científico de nossa época e fornece alguns dados para o entendimento do que seja o espírito de nosso tempo, embora o mesmo venha sendo questionado continuamente sobre sua legitimidade. A obra de Jung reflete o momento de transição entre um determinado modelo social e o surgimento de um novo modelo. A razão, elevada ao posto de deusa pela tradição burguesa iluminista, passou a gozar de onipotência e prestígio, incidindo diretamente na forma como a qual a sociedade se articula e se organiza: na produção em escala global, na filosofia individualista e no consumo de bens e serviços. O sentido da vida vai passando progressivamente do ser para o ter. Tenho, logo existo.
A ideologia mercantil coloca como centro da existência o sujeito produtivo, consumidor, autônomo, racional, disciplinado, o que constitui um caráter externo e propagandista para que seus objetivos de mercado sejam alcançados. Surge o culto da individualidade, da subjetividade, da autonomia de ação, entre outros ideais. Mas, na mesma medida, por outro lado, há o esfacelamento do indivíduo real enquanto tal, substituindo-o por uma abstração ideológica que, na prática, só reflete o eclipse do sujeito e sua profunda alienação em relação ao social e, sobretudo, em relação a si mesmo (daí Jung defender tão enfaticamente a importância do autoconhecimento em nossos dias). Segundo Bauman, nossa situação atual é dada da seguinte forma: "A viagem nunca termina, o itinerário é recomposto a cada estação e o destino final é sempre desconhecido." O foco atual ainda é colocado no individual, mas não no singular, o que é verdadeiramente próprio de cada um, e é o que defende Jung.