Texto retirado do livro "Jung e o Tarô" de Sallie Nichols.
O número desta carta é oito, e o número arábico 8 repete, na dimensão de encaixe, os pratos redondos da balança. Tanto o eixo celeste quanto o terreno estão claramente envolvidos na consecução do equilíbrio.
O simbolismo da justiça acentua sistematicamente uma união harmoniosa de forças opostas. Sentado num trono, a grande figura feminina simboliza o poder do feminino sobre-humano. No entanto, empunha uma espada e usa um elmo de guerreiro, a denotar que a discriminação e a coragem masculinas estão também envolvidas em seu trabalho.
Não segura a espada numa posição de defesa nem de ataque, mas erecta como se pode segurar um cetro ou qualquer outro símbolo de domínio. Talvez A Justiça empunhe a espada dessa maneira para lembrar-nos da espada flamejante à porta do Éden e avisarmos que nunca mais podermos voltar à inocência da infância. Precisamos agora assumir a plena responsabilidade de todo e qualquer conhecimento do bem e do mal que tenhamos adquirido. A arma é enorme e feita de ouro, o que lhe enfatiza mais o valor permanente.
"Não trago a paz, se não a espada." Nessa fase da série do Tarô, o herói deixou para sempre a paz bem-aventurada da inconsciência para assumir o desafio e a responsabilidade que a espada representa. Agora precisa deixar de invectivar os Fados, ou os pais, pelos pecados que cometeram contra ele por mais reais que estes possam ter sido, e assumir o fardo da própria culpa. Só o néscio se interessa pela culpa dos outros, visto que não lhe é dado mudá-la. Se o herói ainda vê os pais como diabos, responsáveis pelos seus erros e limitações, está tão vinculados a eles como estava quando os supunha seus infalíveis salvadores. Cortar o cordão umbilical significa psicologicamente livrar-se de toda e qualquer dependência infantil, tanto negativa quanto positiva. O significado ritual da espada de ouro da Justiça é o sacrifício. Como ato sacrificial, o herói precisa oferecer sua confiança infantil nos pais. Idealmente, os pais usarão também a faca para libertar-se da sua inconsciente dependência dele. Só então poderá haver um relacionamento adulto equilibrado entre as gerações.
A espada também simboliza o sacrifício das ilusões e pretensões de muitos tipos. Aqui o jovem ego deixa para sempre o Jardim do Éden. Já não pode viver a vida provisória de sonhos impossíveis. Cumpre-lhe usar a espada para separar a fantasia da realidade e a balança para pesar as miríades de possibilidades de perfeição que a sua imaginação prefigura, contra as realidades imperfeitas do espaço, do tempo e da energia humana.
A espada representa o áureo poder de discriminação que nos faculta atravessar camadas de confusão e imagens falsas para revelar uma verdade central. [...]
A justiça segura a espada com a ponta voltada para o céu. Sólido e inabalável, o gládio age como fio de prumo para manter-lhe as decisões fieis ao espírito. Na mão esquerda, segura a balança, cujos dois pratos estão ligados por uma base horizontal, que enfatiza o eixo terreno. À diferença da espada, a balança, móvel, dá a entender a relatividade de toda a experiência humana e a necessidade de pesar cada evento individual como um fenômenos único. Seus dois pratos, símbolos da receptividade e dualidade femininas, contrastam com a inflexível e singular afirmação da espada masculina. As respectivas linhas verticais e horizontais da espada e da balança, juntas, formam a cruz da luta espiritual contra a limitação humana, do idealismo contra a praticidade - a cruz sobre a qual somos todos empalados. A Justiça apresenta-se como mediadora entre as duas realidades.
Ela não está olhando nem para a balança nem para a espada; ao invés disso, olha fixamente para frente, quase como se estivesse em transe. É manifesto que sua função requer antes introvisão espiritual do que visão intelectual. Às vezes usa uma venda nos olhos a fim de que o juízo não se deixe confundir por detalhes nem a sua imparcialidade se deixe levar por considerações pessoais. Não está preocupada em combinar olhos e dentes. O seu é um pesar e um balançar mais sutil. Daí a razão por que Aleister Crowley
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